Once upon a time...
... uma gota, numa janela do quarto de uma casa.
O quarto era realmente um primor, cheio de objetos artesanais até no lustre que o teto exibia.
Era domingo, se não sabia.
E embora tudo parecesse incrivelmente convidativo naquele lugar, quente e bem iluminado, a atenção dos olhinhos cor de mel se prendia à pequena gota que vagarosamente escorregava pela janela.
Dona Lúcia, entrou com os bolinhos e xícaras coloridas com coraçõezinhos de várias nuanças, porém, nem mesmo o chocolate quente dispersou o interesse dos pequenos pela gota que, agora já fazendo curva, deslizava pelo vidro.
Ninguém ousava quebrar o silêncio que reinava no ambiente, até mesmo Sansão, o labrador sapeca da família, respeitava aquele momento de plena perplexidade infantil. Ele olhava tentando procurar na janela onde estaria a diversão, mas Sansão não entendia: “Ele era muito inocente ainda”, já diria Marcos. Não se sabe se fora sorte ou azar, mas ele tinha nascido cão e como um bom cachorrinho ele ficaria a par dessa grande maldade.
Mas que maldade?
A maldade que fizeram com a pobre gota. Puseram-na a participar de mais uma aposta e sem direito de escolha. Ah, pois tinha que ser Marcos e Joana, aqueles pestinhas!
Mas que aposta?
Ora essa! A aposta pelo pote de guloseimas da tia Margarida. Joana pegaria o pote para Marcos, se a gota chegasse até a mancha vermelha no peitoril da janela.
E se a gota não alcançasse a mancha vermelha?
Então, quem pegaria o pote seria Marcos.
Ah, não é justo! As chances de Marcos ter que pegar o pote são mais prováveis do que as de Joana.
Mas é que Marcos é menino, tem que ser cavalheiro e educado. Pelo menos fora isso que tia Margarida os disse.
Então, tia Margarida sabe da aposta?
Não, ela apenas disse que meninos têm que ser cavalheiros e educados. No entanto, as chances são as mesmas para ambos, porque se não fora dito antes, digo-lhe agora, a marca de Marcos era até o fecho da janela. Portanto, se a gota escorregasse até a mancha vermelha, Joana se arriscaria. Caso contrário, se a gota atingisse o fecho, seria Marcos o herói da história e, no pior dos casos, haveria um empate e ninguém teria que fazer nada.
E, então, o que aconteceu? Quem fora pegar o pote no fim das contas?
Não houvera necessidade de ninguém o pegar.
E, como não, eles empataram e ficaram sem as guloseimas?
O pote veio até eles.
Como o pote haveria de ter caminhado até os meninos? Potes não têm pernas. Quero dizer, objetos não têm vidas.
É bem verdade o que dizes, contudo, tia Margarida tem as pernas e a vida que os potes não têm e mãos para trazer o que o quiser, inclusive, um pote de guloseimas para aqueles meninos tão entretidos com uma gota na janela.
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